TEXTO 1
A elaboração de normas incriminadoras é função exclusiva da lei, isto é, nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma pena criminal pode ser aplicada sem que antes da ocorrência desse fato exista uma lei definindo-o como crime e cominando-lhe a sanção correspondente. O princípio da legalidade foi consagrado através da fórmula latina nullum crimen, nulla poena sine lege. O princípio da legalidade constitui uma real limitação ao poder estatal de interferir na esfera de liberdades individuais (garantia do indivíduo contra o Estado, jamais pode ser usado pelo Estado contra o indivíduo). O princípio da legalidade é o pilar do chamado Garantismo, corrente ideológica que prega a existência de um poder punitivo mínimo do Estado em face ao máximo de garantias aos indivíduos. Pode-se dizer que ele está previsto em diversos dispositivos normativos: Declaração Universal dos Direitos do Homem (Art. XI, 2); Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Pacto de São Jose da Costa Rica – Dec. 678/98, art. 9º); Constituição Federal de 1988 (Art. 5º, XXXIX); Código Penal (Art. 1º). […] Normalmente são elencados três diferentes fundamentos para o princípio da legalidade. O fundamento político é no sentido de que o princípio da legalidade impede que o poder punitivo estatal esteja baseado no livre-arbítrio. O fundamento jurídico é no sentido de que uma lei prévia e clara tem efeito intimidativo. Por fim, o fundamento democrático é no sentido de que somente o Poder Legislativo, representante do povo, pode regular crimes e penas. […] O princípio da legalidade criminal pode ser visto sob quatro dimensões. 1) Nullum crimen, nulla poena sine lege praevia: não há crime nem pena sem lei prévia, ou seja, sem lei anterior ao fato. É a chamada “anterioridade da lei penal”. A lei penal só pode ser aplicada para os fatos ocorridos a partir de sua vigência. Ou seja: a lei penal deve ser anterior ao fato que ela incrimina, de modo que uma lei penal incriminadora não pode retroagir para atingir fatos ocorridos antes da sua vigência. Por isso essa dimensão também é chamada de “irretroatividade da lei penal”. […] Note-se que essa regra somente se aplica quando a lei penal é mais gravosa ao cidadão (Lex gravior). Se a lei nova lhe beneficiar (Lex mitior), então admite-se sua aplicação retroativa. Assim, a lei penal não pode retroagir, especialmente para prejudicar o cidadão. A irretroatividade da lei penal mais gravosa atinge tanto as tipificações legais como as sanções penais que lhes correspondem. 2) Nullum crimen, nulla poena sine lege scripta: não há crime nem pena sem lei escrita. Dessa forma, não é legítima a criação de crimes e penas pelo costume, ou seja, somente a lei pode criar crimes (lei em sentido formal e material). Os costumes funcionam apenas como fonte formal mediata do Direito Penal, sendo úteis para a interpretação da lei (art. 155, § 1º, CP). 3) Nullum crimen, nulla poena sine lege stricta: não há crime nem pena sem lei estrita. Isso importa na proibição do emprego da analogia para criar crimes, fundamentar ou agravar penas. Ou seja: a analogia in malan partem, que prejudica o acusado, não pode ser usada no Direito Penal. A analogia é a aplicação de uma lei a fatos semelhantes aos que ela regula. Por outro lado, a analogia in bonam partem, que favorece o acusado, pode ser usada no Direito Penal. 4) Nullum crimen, nulla poena sine lege certa: não há crime nem pena sem lei certa. Essa dimensão do princípio da legalidade impõe que o tipo penal contenha a descrição exata, rigorosamente delimitada, da conduta proibida. Essa dimensão é também conhecida como princípio da taxatividade ou mandado de certeza. Em razão dela, é vedada a edição de normas penais vagas, imprecisas ou indeterminadas.
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